JUSTIFICATIVA:
Processo nº 24.154/2021
Excelentíssimo Senhor Presidente:
Tenho a honra de encaminhar à apreciação e deliberação de Vossa Excelência e Nobres Pares, o presente Projeto de Lei que dispõe sobre normas para execução de serviços de Transporte Escolar Gratuito aos alunos matriculados na Rede Municipal de Ensino de Sorocaba.
O presente Projeto de Lei que trata sobre a temática que envolve o transporte escolar gratuito, possui disposição federal que prevê o direito ao transporte escolar, no entanto, não há regulamentação municipal que discipline a matéria, a fim de garantir-se que seja efetivado de maneira igualitária para todos os alunos.
Tal direito é garantido pela Constituição Federal, que prevê em seu inciso VII, artigo 208, que o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de “atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde”. Grifo nosso.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, por sua vez, Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, estabelece que compete aos sistemas de ensino organizarem a oferta da Educação Básica em regime de colaboração, conforme se depreende do artigo 8º, in verbis:
Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.
[...]
§ 2º Os sistemas de ensino terão liberdade de organização nos termos desta Lei.
Ainda, o inciso VII, artigo 10, e inciso VI, artigo 11, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, determinam que compete aos Estados assumirem o transporte dos alunos matriculados na rede Estadual e aos Municípios o transporte dos matriculados na rede municipal respectivamente. Grifo nosso.
Entretanto, a legislação federal não especifica a partir de qual distância mínima entre a residência do aluno e a escola deve ser ofertado o transporte escolar. Por outro lado, a criança e o adolescente têm direito a estudar o mais próximo possível de sua residência, conforme se infere do artigo 4º, da Lei nº 9.394, de 1996. Vejamos:
Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:
(...)
X - vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino fundamental mais próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que completar 4 (quatro) anos de idade. (Incluído pela Lei nº 11.700, de 13 de junho de 2008).
Desta forma, os sistemas de ensino, ao organizarem suas normas para a “Chamada Pública Escolar”, devem incluir a proximidade da residência do aluno como um dos critérios de prioridade para a matrícula, assim como é prioritária a matrícula dos alunos com deficiência.
Destarte, sobre a oferta de transporte escolar, e diante da ausência de lei que especifique a distância mínima a partir da qual o transporte deve ser oferecido, entendemos, com base em decisões judiciais, que o Transporte Escolar deverá ser fornecido aos alunos quando a distância entre a residência e a escola ou entre àquela e o ponto de embarque/desembarque do transporte escolar for superior a 2 Km (dois quilômetros) de distância, independentemente de residirem na zona urbana ou rural. Antes desse limite, é responsabilidade dos pais levar o aluno até a escola ou até o ponto de embarque do transporte escolar, ou buscá-lo, visto que a obrigação é solidária.
Os princípios constitucionais de condições de acesso e permanência na escola, e garantia de padrão de qualidade (incisos I e VI, art. 206, Constituição Federal), devem ser efetivados de maneira igualitária para todos os alunos.
O Estado e Município são solidariamente responsáveis pelo acesso e permanência no ensino fundamental, devendo-se registrar que a norma que estabelece a garantia de matrícula mais próxima da residência do aluno tem por escopo facilitar o acesso à escola, nunca limitar e/ou impedir.
Transporte Escolar como Dever do Estado e Garantia de Acesso e Permanência do Educando no Ambiente Escolar:
No artigo 208, da Constituição encontram-se as obrigações do Estado, no que tange ao oferecimento do ensino público. Trata-se de garantias asseguradas aos educandos, cuja finalidade é o efetivo exercício do direito à educação, estando, entre estas, o transporte escolar:
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
(...)
VII - atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
Delimitação de Competência dos Entes Federativos na Oferta do Ensino Público:
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.
§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.
§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio.
§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, os Estados e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório.
Desde logo, é oportuno destacar a atribuição prioritária dos Municípios, a qual compreende o ensino fundamental e a educação infantil.
Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, a partir do artigo 8º, estabelece, com maior especificidade, as atribuições e competências:
Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais de ensino, integrando-as às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;
(...)
V - oferecer à educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.
VI - assumir o transporte escolar dos alunos na rede municipal. (incluído pela Lei nº 10.709, de 31 de julho de 2003) (grifado)
Assim, fica absolutamente claro que ao Município compete oferecer o ensino fundamental e a educação infantil, cabendo-lhe, ainda, assegurar o transporte escolar aos alunos matriculados na sua rede de ensino. (inciso VII, art. 208, da Constituição Federal).
A Responsabilidade pelo Transporte Escolar:
Vale referir que o inciso VI, introduzido no artigo 11, da Lei de Diretrizes e Bases - LDB, pela Lei Federal nº 10.709, de 2003, deixa clara a responsabilidade do Município no transporte escolar, qual seja, de transportar os alunos matriculados em sua rede ensino, isto é, nas escolas Municipais.
Art. 10. Os Estados incumbir-se-ão de:
[...]
VI - assumir o transporte escolar dos alunos da rede estadual. (Incluído pela Lei nº 10.709, de 31 de julho de 2003)
Portanto, está delimitada a responsabilidade de cada um dos entes posição sustentada por e este artigo, cujo entendimento é de que a Lei Federal traz a delimitação precisa da responsabilidade de cada um dos entes.
A Lei nº 10.709, de 2003, foi instituída com o escopo de alterar a Lei nº 9.394, de 1996, incluindo o inciso VII, ao artigo 10, e o inciso VI, ao artigo 11 para determinar competência aos estados e municípios em garantir o transporte para os alunos de suas respectivas redes de ensino. Vale destacar que o artigo 3º desta Lei possui um dispositivo de suma importância para negociações entre os estados e municípios, de forma a prestar um atendimento de qualidade a todos os alunos que precisam do transporte para ter garantido o seu direito à educação.
Art. 3º Cabe aos estados articular-se com os respectivos municípios, para prover o disposto nesta lei da forma que melhor atenda aos interesses dos alunos.
O Caráter Suplementar do Transporte Escolar, a Responsabilidade da Família, a Definição do Trajeto da Linha Escolar e a Distância a ser Percorrida pelos Alunos:
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Como a própria Constituição refere, os programas indicados pelo inciso VII, do artigo 208, possuem caráter suplementar, uma vez que a família possui obrigação precípua em relação ao educando.
Portanto, pode-se afirmar, em linhas gerais, que não é só do Estado, mas também da família, dos pais ou responsáveis legais, a responsabilidade pelo desenvolvimento de ações que assegurem o direito à educação.
Nesse sentido, o transporte e a facilitação do acesso à escola não incumbe exclusivamente ao Estado, a quem compete oferecer a linha de transporte escolar, mas também à família, que não está isenta de colaborar no transporte de sua criança ou adolescente:
Trata-se de preceito primordial, que jamais pode ser esquecido quando se estiver tratando de transporte escolar prestado pelo Município - a educação é dever do Estado, do Município, e, também, da família (art. 205). É a chamada corresponsabilidade.
Exceção Alunos residentes nas áreas rurais.
REGISTROS:
É importante registrar que não existe disposição legal constitucional ou de Lei Federal que delimite o trajeto da linha de transporte ou a distância a ser percorrida pelo aluno até o ponto de passagem do veículo escolar.
O trajeto do transporte, seus pontos de passagem e parada são definidos pelo Poder Público, o qual deve utilizar-se para tal fixação dos critérios de bom senso, razoabilidade e viabilidade.
É pacífico o entendimento de que as vagas à educação infantil e fundamental devem ser ofertadas em escola próxima à residência, tendo sido adotada a distância de dois quilômetros como critério definidor de proximidade e de fornecimento de transporte escolar.
Convém deixar registrado que a Secretaria do Estado de São Paulo adota o critério de 2 km (dois quilômetros) para a concessão do transporte escolar aos alunos matriculados na rede estadual de ensino.
Deve estar regulamentado em Lei, Decreto etc..
Em resumo, pode-se dizer que ao Município não incumbe exclusivamente toda a responsabilidade pelo transporte do educando, havendo a necessidade de cooperação por parte da família. Sendo que a definição do trajeto é ato discricionário da Administração, a qual deverá encontrar fundamento, é claro, em critérios de possibilidade, necessidade e razoabilidade.
Portanto, verifica-se inequivocamente, a obrigação da municipalidade de transportar os alunos matriculados em sua rede de ensino, isto é, nas escolas Municipais. No entanto, comprovado está que tal responsabilidade é solidária entre o poder público e as famílias. É a chamada corresponsabilidade.
O Estado e Município são solidariamente responsáveis pelo acesso e permanência no ensino fundamental, devendo-se registrar que a norma que estabelece a garantia de matrícula mais próxima da residência do aluno tem por escopo facilitar o acesso à escola, nunca limitar e/ou impedir.
Destarte, sendo pacífica a obrigação do Município em fornecer transporte escolar gratuito aos alunos, matriculados em sua rede de ensino, e também que essa obrigação é solidária com as famílias, a questão que se propõe é a definição dos critérios para a concessão desse direito ao transporte escolar.
É importante ressaltar que há fatores econômicos, administrativos, legais e sociais que determinam o critério definidor de proximidade casa-escola, para a concessão do direito de pleitear a gratuidade do transporte, senão vejamos:
1 - Econômicos: A rede municipal de Ensino de Sorocaba é composta por 175 (cento e setenta e cinco) escolas, contando com 13.219 (treze mil, duzentos e dezenove) alunos matriculados na Educação Infantil e 32.373 (trinta e dois mil, trezentos e setenta e três) alunos matriculados no Ensino Fundamental, totalizando 45.592 (quarenta e cinco mil, quinhentos e noventa e dois) alunos matriculados nesses segmentos. Não seria possível, e nem viável logística ou economicamente fornecer transporte escolar gratuito a todos os alunos. Há necessidade de haver critério definidor consistente, visando atender às finalidades primordiais do instituto, que é garantir o acesso e permanência do aluno na escola.
Deve-se aplicar ao caso, o princípio da razoabilidade, que dispõe, que essencialmente, deve haver uma proporcionalidade entre os meios de que se utilize a Administração e os fins que ela tem que alcançar, e mais, que tal proporcionalidade não deve ser medida diante dos termos frios da Lei, mas diante do caso concreto.
Destarte, considerando atualmente o critério de 2 km (dois quilômetros), já há um desembolso anual em torno de R$ 15.000.000,00 (quinze milhões) com o transporte escolar gratuito, em sendo alterado esse critério para 1,5 km (um quilômetro e meio), haveria um acréscimo considerável do valor do contrato, tornando inviável a execução do serviço. Atualmente já são atendidos 3.155 (três mil, cento e cinquenta e cinco) alunos com ônibus fretado e 182 (cento e oitenta e dois) alunos beneficiados com passes sociais aos pais (alunos de escola) e 67 (sessenta e sete) alunos recebem passe estudante (Fundamental). Totalizando 3.404 (três mil, quatrocentos e quatro) alunos já atendidos com transporte escolar gratuito, considerando os 2km (dois quilômetros) de distância casa-escola.
Conforme análise dos estudos em tela, se for considerada a distância entre a casa/escola em 1,5 km (um quilômetro e meio) para todos os alunos, sem critérios, haverá um adicional de 88,76% (oitenta e oito inteiros e setenta e seis centésimos por cento) de acréscimo no quantitativo de alunos atendidos pelo transporte escolar gratuito. Em valores podemos registrar que o desembolso com o contrato, vai ultrapassar R$ 28.000.000,00 (vinte e oito milhões de reais) anuais.
2 - Administrativos: Considerando ainda, que a rede Municipal e Estadual de Ensino, atendem o ensino fundamental de forma colaboração, atendendo o mesmo público alvo (Ensino Fundamental I e II), e o Estado de São Paulo adota como critério definidor a distância de 2km (dois quilômetros), não há como esta municipalidade adotar critério divergente. Caso isso acontecesse haveria uma migração em massa dos alunos do Estado para rede municipal, não havendo condições de atendimento.
Ademais, se fosse adotado outro critério, haveria tratamento desigual entre alunos matriculados nas duas redes. São alunos de redes diferentes, no entanto são cidadãos sorocabanos, tendo direitos iguais de acesso e permanência nas escolas.
3 - Legais: Como não há Lei Federal que especifique a distância entre casa-escola, para concessão do benefício, é pacífico o entendimento jurisprudencial de que as vagas à educação infantil e fundamental devem ser ofertadas em escola próxima à residência, tendo sido adotada a distância de dois quilômetros como critério definidor de proximidade e de fornecimento de transporte escolar. A jurisprudência é considerado o conjunto das decisões dos tribunais, no exercício da aplicação da Lei. Representa a visão do tribunal, em determinado momento, sobre as questões legais levadas a julgamento.
Vale salientar, que inclusive conforme Termo de Ajuste de Conduta, objeto da Ação Civil Pública nº 1039664-05-2016-8.26.0602, que tramitou perante a Vara da Infância e Juventude de Sorocaba, foi reconhecida a necessidade do poder público fornecer transporte escolar gratuito para distâncias superiores a 2km (dois quilômetros).
4 - Sociais: Caso houvesse a diminuição do critério definidor para 1,5 km (um quilômetro e meio) para todos os alunos, haveria um grande impacto negativo entre os condutores de vans escolares. Sabe-se que com a pandemia, essa categoria vem sofrendo arduamente com a suspensão de aulas que ocorreu até meados do ano de 2021, e que somente agora começam a retomar timidamente as atividades. O público-alvo atendido pela categoria é absolutamente o mesmo, dos que residem entre 1,5km (um quilômetro e meio) e 2 km (dois quilômetros) de distância entre a residência e a escola, pois distância inferior a 1,5 km (um quilômetro e meio) não compensaria contratar vans escolares, e superior a 2 km (dois quilômetros) já é contemplado pelo transporte escolar gratuito. Portanto, esse seria motivo adicional para manter-se o critério definidor de 2km (dois quilômetros) para a concessão ao direito ao transporte escolar gratuito.
No entanto, há que considerar-se que as crianças atendidas pela rede municipal de ensino de Sorocaba, são na maioria entre a faixa etária de 5 (cinco) a 12 (doze) anos, ou seja, da Pré-Escola e Ensino Fundamental I, e que necessitam de um adulto para acompanhá-los até a escola. Há casos em que famílias mais vulneráveis socialmente não tem condições de levar e trazer as crianças da escola, acarretando muitas faltas e até evasão da escola.
Portanto, nos casos de vulnerabilidade social, comprovados através da inscrição da família no Cadastro Único - CadÚnico para Programas Sociais do Governo, justificar-se-ia a definição do critério a partir de 1,5 km (um quilômetro e meio), de forma a evitar-se a evasão escolar, faltas sucessivas e dificuldades de aprendizagem do nosso alunado.
Diante de todo o exposto, torna-se imperioso que o direito ao transporte escolar gratuito seja regulamentado, como forma de garantir-se tratamento igualitário entre os alunos matriculados na rede Municipal de Ensino de Sorocaba, garantindo-se os Princípios Básicos Implícitos da Administração Pública: Princípio da Supremacia do Interesse Público, Presunção de Legitimidade ou Presunção de Legalidade, Princípio da Continuidade do Serviço Público, Princípio da Igualdade ou Princípio da Razoabilidade, Princípio da Motivação e Princípio da Segurança Jurídica.
Portanto, demonstrada a necessidade de regulamentação do transporte escolar gratuito para os alunos matriculados na rede Municipal de Sorocaba, encaminha-se o presente estudo, justificando-se plenamente a necessidade de definição de critérios para a concessão do benefício.
Por todas as razões aqui expostas, entendo estar devidamente justificado o presente Projeto de Lei, conto com o costumeiro apoio de Vossa Excelência e D. Pares no sentido de transformá-lo em Lei.